Em uma postagem anterior, listei doze dicas que considero
muito úteis na confecção de um texto, principalmente teórico, e agora acrescento
outras doze.
1. Deve-se
evitar a pressa em concluir, que se evidencia por uma grande quantidade de
conjunções como “portanto”, “assim”, “desse modo”. Muitas vezes, uma ideia mal
foi colocada em uma primeira frase e a seguinte já se inicia com uma partícula
conclusiva, o que se agrava com a inserção de outras nas orações seguintes,
chegando ao paroxismo de se iniciar um parágrafo com um sonoro “portanto”! Toda
vez que se cogite usar tais conjunções, deve-se questionar se a frase em
questão é de fato uma consequência da anterior, pois frequentemente ela apenas
acrescenta uma nova formulação do problema.
2. Em um
texto teórico, deve-se evitar o excesso de anúncios de que se passará a um
determinado tema ou assunto, como expresso pelas expressões típicas: “outro
tópico de interesse é...”, “agora abordaremos o tema da...”, “passemos à
temática do...”. Quando em quantidade excessiva, tais falas tendem a
caracterizar o texto como um fichamento ou resumo, pois se perdem a fluência e
a continuidade argumentativa.
3. Evite o
excesso de substantivação de verbos: “a realização”, “a consumação”. Eles
conferem ao texto um tom mais intelectual, mas quando em excesso tornam-no um
tanto pedante e rebuscado. Em vez de “A televisão proporciona a deturpação das
mensagens”, use “A televisão deturpa as mensagens”; em vez de “Essa medida
provoca a redução de prejuízos”, use “Essa medida reduz prejuízos”. Como se vê
nesses exemplos, a substantivação do verbo tende a escamotear a ausência de
conteúdo, substituindo-o por uma formulação pretensamente mais sofisticada. Em
alguns textos, quando se trocam todos os substantivos pelos verbos dos quais
derivam, revela-se um discurso trivial, sem qualquer substância argumentativa.
4. Não cite
palavras estrangeiras sem ter conhecimento do idioma, a não ser que tenha plena
certeza de seu significado e de sua grafia. Uma vez que a indicação do termo
original tem como sentido auxiliar a precisão da leitura, é contraproducente
citar uma palavra que apresente incorreções de grafia e não corresponda à
proposta de tradução. — Um caso muito comum em que se desmascara imediatamente
a ausência de conhecimento do idioma original é a citação de substantivos
alemães sem inicial maiúscula, pois, ao contrário de todas as outras línguas
ocidentais, em alemão não só os nomes próprios têm inicial maiúscula, mas
qualquer substantivo;
5. Não se
devem começar frases (e muito menos parágrafos) com as expressões “ou seja” e
“isto é”, pois elas somente fazem sentido para conectar uma explicação a uma
ideia imediatamente anterior, em um fluxo de argumentação incompatível com a
separação de frases; além disso, deve-se evitar seu excesso, pois muitas vezes
a frase iniciada com essas locuções não explica a anterior, mas sim acrescenta
outra ideia.
6. Evite o
que podemos chamar de “explicativismo”, o excesso de elementos elucidativos. No
afã de tornar claro um conceito teórico considerado um tanto difícil,
colocam-se muitos apostos e especificações desnecessários. No limite, esse
didatismo soa até mesmo ofensivo, dando a ideia de que a/o leitor não é capaz
de apreender a ideia com apenas um elemento explicativo.
7. Em uma
grande quantidade de vezes as palavras “pessoas”, “indivíduo” ou “sujeito” são
totalmente dispensáveis, constituindo redundâncias. Quando se diz, por exemplo:
“a recepção da indústria cultural pelas pessoas é muito influenciada por
valores de classe”, a expressão “pelas pessoas” é dispensável, pois é genérica
e somente indica o que já se sabe: não há recepção de indústria cultural a não
ser por “pessoas”!
8.
Sobrecarrega o texto empregar muitas vezes seguidas a preposição “de” entre
palavras; isso ocorre quando se quer adensar uma formulação teórica, mas a
escrita tende a ficar confusa. Exemplo: em vez de “A exigência da consideração
da incerteza das condições históricas do objeto leva-nos...”, deve-se usar: “O
fato de sermos exigidos a considerar a incerteza das condições históricas do
objeto leva-nos...”.
9. Somente se
devem indicar termos de língua estrangeira do texto estudado quando a tradução
apresentar alguma dificuldade, momento em que o conhecimento do termo original
tem valor; fora desses casos, configura uma inadequação, podendo ser visto como
esnobismo.
10. Deve-se
ter cautela com o uso de palavras que denotem intensidade ou ênfase diante de
adjetivos, particularmente os que já exprimem uma intensificação; exemplos:
“muito claro”, “bastante evidente”, “extremamente enfático”; cada um desses
adjetivos já acentua a noção contida na palavra seguinte, não carecendo de
qualquer reforçador na maioria das vezes.
11. Procure
manter coerência entre os sentidos de prejuízo e de favorecimento entre verbos
e seus objetos. Exemplos: “alcançar” tem implícito o sentido de conseguir algo
bom, de modo que se insere certa dissonância cognitiva ao se dizer “Esse
projeto alcançou grande fracasso nas avaliações da firma”, ao passo que “isento
de” tende a se referir a algum ruim, de modo que “Essa perspectiva está isenta
de vários aspectos positivos” deve ser alterada para “Essa perspectiva está
desprovida de vários aspectos positivos”.
12. Embora
seja um item de menor importância, em alguns casos contribui para a fluência da
leitura: tendo falado de duas pessoas, e em seguida se quer referir a ambas com
as palavras “a primeira” e “a última”, é recomendável que a designada como
“primeira” tenha vivido anteriormente, quando for o caso. Exemplo: “Descartes
tem uma filosofia tipicamente racionalista, enquanto Nietzsche se coloca no
extremo oposto; enquanto o primeiro tem uma preocupação cognitiva, o último se
esforça por refletir sobre os valores”.